segunda-feira, 6 de junho de 2011

Coexistência

A outra estava lá. Encoberta, disfarçada, fantasiada de nada. Era melhor que fosse dessa maneira, assim, poderia agir sorrateiramente, se infiltrando e minando toda espécie de entusiasmo ou sensação de bem estar.
Bom mesmo se elas tivessem convivido pacificamente. Impossível. Egoísta, a outra jamais se permitiria dividir espaço com alguém. Ela queria reinar absoluta e ditar as regras.
Quando ainda criança, a menina não percebera quem criara "aquilo" ou que ela sequer existia. Viveu sua inocente infância, onde seu mundo se restringia às bonecas, trocadas diversas vezes pelas mesas de conversa adulta, onde o assunto parecia muito mais interessante, e não percebia que a outra caminhava lado a lado contigo, quase como sombra.
A adolescência foi mais complicada. Já sob seu julgo, a menina, ainda sem perceber, agia contra sua vontade, contrariada, desacreditada de si, numa briga interna e eterna contra si e contra a outra. Mas aquela se fortalecera pelos percalços da vida e cada vez mais exercia seu domínio sobre menina.
Por fim, ja em fase adulta, talvez pela maturidade, resolveu que não ia mais brigar. Se a presença da outra era inevitável, então que ela também se acostumasse com seus rompantes de alegria, misturados aos momentos de insatisfação e melancolia. Nesses últimos, a outra se regozijava.
Mas o tempo trouxe para a menina a independência ou pelo menos a vontade dela. Queria autonomia. Sentir por si mesma, determinar e coordenar a sua própria vida. A briga foi grande! Como desfazer um laço atado desde a mais tenra idade? Seria possível se desvencilhar? A menina sofreu, mas determinada, não abriu mão de si.
Hoje, se encontram, mal se olham, tentam não lembrar do poder que exerciam uma sobre a outra, é melhor não lembrar o passado. A menina ainda não se sente totalmente segura, ainda titubeia pra levantar a cabeça e caminhar com um andar altivo. Está aprendendo... Afinal, demora pra se aprender a autoestima e o amor próprio.

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